«O optimismo é uma preguiça do espírito». E. Herriot. + «Uma assombração que se preza não pode ser preguiçosa. Buuuh!». O Fantasma do Misantropo.
Atracção incontrolável da mulher pelas grades reais que A aprisionem? Estipulação do carácter imaginário das prisões de que Tantas se queixam? Necessidade de erguer um mito como estímulo do onirismo que facilite as transformações interiores? Superioridade da Mulher que se deixa aprisionar? A real ou pretensa prisão como única escapatória ao Deserto?
Com esta pluralidade de opções deixadas aos Leitores desejo a Todos um belo fim de semana.
Dos Sete Pecados Capitais a Preguiça sempre foi o meu preferido, porque, não constando da linha inicial, sempre o assimilei ao suplente que entra para resolver o jogo. O titular era a Acedia, com tudo o que implica de obstáculo a tomadas de posição, nunca tendo por cá abundado. A Preguiça, que a substituiu, é a própria base da condição onírica, sem a qual não nos podemos melhorar, bem como da disponibilidade, em cuja ausência os outros não podem pegar para as trocas de afecto.
Salvo um qualquer monstro, acredito que François Hertel estava coberto de razão quando dizia que «no fundo aqueles que se acreditam laboriosos não passam talvez de preguiçosos que se ignoram». Pelo que a representação gráfica deste estado de espírito e de corpo, da autoria de Félix Vallotton, nascido a 28 de Dezembro, com as duas Perfeições Maiores do Mundo, a Mulher e o Gato, encontrando o momento para se acariciarem e, imagina-se, ronronarem, é não pequena imagem da utopia suprema da Concórdia.
A 25 de Dezembro de 1541 era aberto à vista do público o extraordinário fresco da Capela Sistina «O Julgamento Final». Sabe-se como a nudez ostensiva de alguns personagens veio, mais tarde, a despertar celeuma, sendo ordenada a sua parcial cobertura, que um Miguel Ângelo octogenário quis empreender por própra mão, sem o conseguir, no entanto.
Menos conhecida é a historieta, contada por Vasari, de como o Artista pintou um seu inimigo, o dignitário pontifício Biagio de Cesena entre os condenados ao Inferno. Tendo-se este queixado ao Papa, obteve a jocosa resposta: «Se estivésseis entre os que figuram no Céu, teríamos uma palavra a dizer. Mas do Inferno só a Misericórdia Divina vos pode salvar...».
Duas histórias exemplares que demonstram como, por vezes, embora excepcionalmente, fazer é mais fácil do que desfazer. Sem tirar nem pôr.
Para em cada casa lembrar O Mais Belo Amor do Mundo, com
Alphonse Daudet:
Dans ses langes blancs fraîchement cousus,
La vierge berçait son enfant Jésus.
Lui, gazouillait comme un nid de mésanges,
Elle, le berçait et chantait tout bas
Ce que nous chantons à nos petits anges.
Mais l'enfant Jésus ne s'endormait pas.
Etonné ravi de ce qu'il entend,
Il rit dans sa crèche et s'en va chantant
Comme un saint lévite et comme un choriste
Il bat la mesure avec ses deux bras
Et la sainte Vierge est triste, bien triste
De voir son Jésus qui ne s'endort pas
Doux Jésus lui dit la mère en tremblant.
Dormez mon agneau, mon bel agneau blanc,
Dormez il est tard, la lampe est éteinte
Votre front est rouge et vos membres las
Dormez mon amour et dormez sans crainte.
Mais l'enfant Jésus ne s'endormait pas.
"Si quelques instants vous vous endormiez
Les songes viendraient en vol de ramiers
Et fearaient leurs nids sur vos deux paupières.
Ils viendront dormez doux Jésus."
Hélas ! inutiles chants et vaines prières,
Le petit Jésus ne s'endormait pas.
Et Marie alors, le regard voilé
Pencha sur son fils son front désolé :
" Vous ne dormez pas, votre mère pleure,
Votre mère pleure, ô mon bel ami !..."
Des larmes coulaient de ses yeux
Sur l'heure le petit Jésus s'était endormi.
Sei que a época é de votos pios, frequentemente sem seguimento. Mas, mesmo ciente de que onde está o Homem está a Guerra, gostaria de que as mãos que se unem para orar a Deus não carecessem de protecções destas quando estreitassem as de outros credos, por causa dos espinhos que eles lhes apontassem.
Não era nada que eu não temesse, todavia calei, para não agourar. Se forem confirmados os receios dos responsáveis pela segurança britânica, sobre a forte probabilidade de um ataque da Al-Qaeda durante o Natal, ficarão definitivamente desmascarados os protestos de respeito pela Figura de Jesus, da parte dos fundamentalistas do Islão.
Cuidado com os portadores de barbas que se cruzem Convosco! Há alguns que se deseja que não tragam prendas...
Feliz Natal, apesar dos pesares.
O Almirante Luís Carrero Blanco foi assassinado num 20 de Dezembro. No fim de contas o destino de que conseguira miraculosamente escapar aquando da eclosão da Guerra Civil, em que as milícias vermelhas bem o tentaram caçar. Os anos que mediaram entre um martírio tentado e um outro, efectivado, transformaram um obscuro, embora competente, oficial de marinha no braço direito do Caudilho. Era um Homem de Paz: tomou posição contra a beligerância espanhola na Segunda Guera Mundial, no plano externo; e fortaleceu a solução sucessória monárquica, contrariando a radicalização partidária do Movimiento e do Estado, cara aos Falangistas mais exaltados. Diz-se que, na eventualidade da chefia do Governo, após a morte de Franco, teria prolongado o status quo. Não estou tão certo, pois o seu ultramonarquismo poderia pesar no prato da balança que equilibraria com o da fidelidade à Memória do Salvador da Espanha. Mas Deus, pelas tortíssimas linhas que se conhecem terá permitido que os terroristas acabassem por escrever direito, ao poupá-lo a esse dilema.
Perante a Memória de um Homem Bom curvo-me respeitosamente.
Aniversário de Paul Klee. Trago, dele, «Contos de Fadas». As fadas são nas tradições mitológicas que mais as desenvolveram uma realidade ambivalente, que pode ser muito nociva ao Homem. O nosso desesperante optimismo, porém, reinventa-as, reduzindo-as às fadas boas, nas histórias que contamos às nossas crianças. Assim as figuras presentes neste trabalho, para mim desde sempre assimiladas ao plancton sem o qual não podem viver os nadadores das profundezas mentais que todos somos, a menos que optemos por morder os iscos que anzóis matreiros nos propõem. É à salvaguarda da nossa sanidade, que nos garante uma subsistência sem nos deixar enredar nas artes que nos percam que assimilo este quadro sedutor.
No aniversário de António de La Gandara, gostava de partilhar Convosco o talento especial que este pintor de Damas da Belle Époque também tinha para a caricatura, no caso a de artistas frequentadores do célebre cabaret Le Chat Noir, onde se aglomeravam com felicidade pintores, desenhadores, músicos, poetas e prosadores da têmpera de Picasso, Caran D´Ache, Satie, Débussy, Cros, Verlaine, Laforgue...
Repare-se no traço, que, na minha perspectiva, a qual admito pessoalíssima, apresenta pontos de contacto pronunciados com os exemplos dos tipos dos teóricos da Fisiogonomia. Mas sem pseudo-ciências, frua-se o talento da exageração.
Morto de cansaço, depois do exercício dispendido a passar por Betas, aliás feminização de nome de defesa, ainda tempo para lembrar um «Repouso», de Pierre Puvis de Chavannes que hoje aniversariaria, o qual julgo bem oportuno, esperando que o Jantar das Quintas da Marta tenha corrido bem.
Não aprecio o Sr. Al-Fayed, pai do derradeiro caso amoroso de Diana de Gales. Penso-o aproveitador da publicidade da morte do próprio filho para tentar melhorar a sua posição no Reino Unido, o que se evidencia a partir das suas acções públicas. Mas não me atrevo a concluir que a sua insistência em que o acidente fatal de Paris foi provocado pela Inteligência britânica não se deva ao amor de Pai que se viu privado de um filho. A ficção pode bem ser a filha preferida da dor.
Mas o que não tem desculpa é querer sujar o nome de um investigador reputado, apenas porque não concordou com o seu anseio. Pouco a pouco vê esfumar-se todos os frágeis pontos em que assentava a sua teoria da conspiração. O mais forte era a gravidez da Princesa. Não que trouxesse qualquer problema à Coroa, com o divórcio já decretado. Mas possuiria uma força mobilizadora de suspeições no íntimo das gentes. Assim, com a confirmação da falsidade dessa alegação, a sua carreira dos tablóides ameaça entrar na via descendente.
Sempre vi Munch como um pintor realista, por muito que o arredem dessa escola: o facto de nos ter dado várias versões de «O Grito», demonstra bem que estava ciente de não ser a insuportabilidade um caso isolado, no Mundo Contemporâneo. Mas quem pinta felinos pode confiar na prioridade que lhes darei, fatalmente. Trago-Vos assim «A Gata», sublinhando a misoginia com o rabo de fora, pintando a insaciável em pose de Salomé, com a cabeça masculina entre as mãos, o que também se inseriria numa linhagem de detracção feminina associada aos grandes gatos, lembremo-nos de Tourneur.
Mas há um escapismo: a de quatro patas, partícipe num exercício de voyeurisme...
O grande norueguês nasceu a 12 de Dezembro.
O que há de irónico no destino do porta-aviões francês Clemenceau é uma arma temível, concebida para matar os alvos que a sua tripulação determinasse, ter-se virado contra os próprios que a pretendiam utilizar, ameaçãndo a saúde e a vida de todos quantos nele navegavam, em virtude dos altíssimos teores de amianto empregues na sua construção. Começou agora o respectivo desmantelamento, fim bem mais inglório que qualquer honroso afundamento em combate. Mas este pobre termo não nos levará inteirinhos a reflectir na imensidão de edifícios construídos irresponsavelmente com os mesmos cancerígenos materiais, que, protegendo muito embora do fogo, acabaram por queimar os organismos de utilizadores que não estariam preparados para o risco imediato de morrer?
Augusto Pinochet faleceu. É bom que fique registada a baixeza mais recente dos seus inimigos, a de acusarem os médicos de falsear diagnósticos quanto à gravidade da sua situação clínica, alegadamente para evitar a perseguição que lhe preparavam. Actos que falam por si.
Neste espaço em que dou largas ao meu lado fantasmagórico nada parece mais adequado do que postar «Heitor Aparecendo a Eneias», no dia em que se lembra a morte de quem o pintou, Girodet-Troison. Ademais, faz-me lembrar os sonhos que tinha, privados de cores vivas até há pouco tempo, tendo, na adolescência, ficado mesmo limitados ao preto e branco.
O Egipto é um exemplo. Não hesitou em expulsar uma série de indivíduos franceses e belgas, por os suspeitar de islamismo. Precisamente o contrário do que acontece aos europeus, sempre acusados de discriminação e pressionados à inacção, a partir do seu interior, de cada vez que tentam reenviar para o seu país de origem indivíduos com tndências extremistas de religiosidade suspeita. É a diferença entre duas concepções do boomerang: A religião que viu os seus princípios exportados para longe, não se deixando atingir pela volta dela a velocidade maior. Enquanto que indefesos, porque auto-castrados, estados europeus, que se pensavam ter visto livres de jovens de tendências perigosas, os vêem voltar, com o perigo ampliado pelo exemplo dos gurus que foram procurar. E, desgraçadamente, não parece que os Membros da UE tenham mãos para apanhar o objecto de arremesso, no seu regresso. Imperícia que se paga, com a alta probabilidade de virem a ser atingidos por ele...
A notícia boa do dia é ter o Presidente Bush, em razão das mudanças de maioria no Senado Norte-Americano, desistido de manter como embaixador nas Nações Unidas John Bolton, que ainda não foi confirmado. Manifestei-me, em tempo contra a sua nomeação. Não tenho um pingo de estima pela ONU, porém odeio incongruências. E colocar como delegado a uma organização alguém que defendeu dever o estado que representa não fazer parte dela parece-me uma sucessão de incompatibilidades que não dignifica quem aceita a incumbência nem melhora as insuficiências do forum no qual aquele actuará. Além disso, o homem é um desbocado e dessas incorrecções pessoais, que não políticas, está o Inferno que é a Terra cheio.
No dia de São Francisco Xavier, esta excelente leitura, sobre o Instrumento de Fé e de Expansão política em que Se constituíu o Nobre Espanhol, ao serviço das cruzes de Cristo que D. João III queria estender para Oriente, contrariando o propósito inicial de Santo Inácio que O destinava, primeiramente, a um seminário em Portugal. Na tripla universalidade do Catolicismo, da Companhia e da Coroa Portuguesa se desenrolou o Trabalho culminado pelo Martírio que só a retracção setecentista de Poderes tomados por Ministros mais ciosos dele para particularismos do que os Reis viriam a enfraquecer, gerando as sementes da debilitação dos Tronos, num século, como da deterioração da conquista do Nascente, em breve reduzida à dominação. Sem a grandeza generosa da Conversão que visa aumentar irmãos e haveria de ser apontada como inimigo pelo materialismo emergente dos independentismos dominados por dirigentes ávidos, os quais,uma vez instalados, se haveriam de revelar os mais corruptos de todos.
São Francisco nunca vergou. Como no célebre episódio de Melinde, em que tendo cativado o mais importante vulto Maometano com a cordialidade que evidenciava, não hesitou em mudar o registo para o fulminante tom, quando retorquiu ao anfitrião lamentoso da decadência religiosa islâmica que admirava era a subsistência desses mesmos restos, quando consideradas as patifarias cometidas na zona, em nome dos princípios do Profeta.
Mas enquanto o Exemplo permanecer na Memória das Gentes nem tudo estará perdido.
Georges Seurat faria anos hoje. O seu «No Concerto Europeu» apresenta fumos de antecipação: uma fantasmagórica encenação de coerência testemunhada pelos divididos elementos empertigados por detrás das suas toilettes e penteados: ou a denominada União fazendo-se passar por Unidade.